Bú, de Alegra Catarina.

Boneco de Neve em 3D, de Alegra Catarina.

Nobody knows my name…”

Era passado das vinte horas, quando desafiei velho amigo a um duelo. Minha espada-de-são-jorge morreu. E a do samurai, não creio que a trouxe. Perdemos contato desde a vez que caí da antiga ponte pênsil, numa escarpa, nos alpes argentinos. Sei que goza saúde, e superou tudo, mal sentiu minha falta. Perdoo.

Demorei perto de duas décadas para conseguir restabelecer os primeiros movimentos nos dedos congelados. Foi o pior: ficar sem poder registrar tudo que se passou. Mas há memórias internas. As pernas tiveram de ser reconstituídas, e foi possível porque ensinei o Homem da Neve a escrever. Encomendou as cambias, feitas sob medida na impressora 3D. Ele achou a cor dos meus cabelos simpática na época, e me salvou.

O frio, descobri, não é nenhum monstro, e meu corpo ao longo dos anos desenvolveu novas habilidades de auto controle, graças ao contato direto com o gelo. Foi uma espécie de evolução mutante. Consegui blindar num cristal, meu coração fogo, evitando derreter as geleiras, quando voltou a funcionar. Agora sou capaz de gerar energia a partir de feixe de luz. Ouço Bessi Smith, enquanto narro e o espero. Radio que encontrei abandonado. Com ela aprendi quatro importantes palavras em inglês, que me permitirão viajar sem ser identificada pelo faro do vento caipira.

Vamos à luta. Improviso as armas, usando dois gravetos. Eu devia tê-lo buscado no aeroporto, mas o tempo está ótimo, e sei que preferiria caminhar, reconhecendo a paisagem. Quem espera, espera sempre um pouco mais. “- Aí está ele!” Continua magro, noto. Cumprimenta. Posiciona-se. Jogo-lhe o florete, segurando pela ponta e alcançando o cabo. Ele ainda pensa rápido e pega no ar. Tempo de eu observar a cor do Panamá, por onde jamais passei.

Posiciono-me. Esticamos as mãos na direção do outro. Olhos cravados nos olhos, indicando que a luta vai mesmo acontecer. Avançamos um passo à frente. E outro à própria direita. Então sorrio. Ato contínuo, sincronizado… Desarmamos a defesa e partimos para o abraço. Ele tira o chapéu. Solto meus fios brancos, agora longos até a cintura, que me toma, dando um cheiro. “- Cadê teus cabelos?”, caçoo, acariciando o lustre. Ele ri. É a senha. “- Entre. Tenho assunto a tratar contigo. O lugar para onde vamos daqui, está repleto de jacarés. Última vez muito nos preocupou a neve. Nesta teremos de nos adaptar ao calor 45ºC. A linha do Equador não é bem nossa praia. Talvez possamos começar treinar juntos antes, Dragon Mestre. Tenho aqui dois pedaços de carvão, para desenharmos um mapa. Vivemos com pouco, nesta ala.