Coração de gente é como almofada de feltro. Você vê todo aquele feltro ali e fica imaginando que vai dar para umas três almofadas. Mas quando começa a encher vê que tudo aquilo cabia em uma só. Enche, senta em cima, testa e conclui que cabe mais um pouco. Se um dia desmanchasse e o feltro caísse todo para fora, ficaria olhando para aquilo e seria inevitável pensar: nunca mais vai caber de volta. E cabe. Alguns brincam com a expressão “é muita areia pra meu caminhãozinho”, querendo dizer a mesma coisa. Como se pudesse ficar apavorado com a ideia de amar tanto (ou tudo aquilo!). Mas quem amou de verdade, um amor do tamanho de uma montanha de feltro, e teve de acabar, olha para aquele sentimento todo e sente uma angústia. Tem vontade de chamar a pessoa e dizer: “Escuta aqui! Está vendo todo este amor? Pode levando consigo, que é todo teu!…” Mas não pode. Tem de dar um jeito de acomodar dentro do peito. E sempre tem mais um cantinho onde cabe. O problema é encontrar paciência. Queremos acomodar tudo de uma vez só.

Mais ou menos por isso que, todo aquele que já amou muito, e se viu por alguma razão separado de quem amou, já deve ter orado. Talvez eu esteja enganada, falando por mim mesma. Podem me chamar de tola. Garanto-lhes, nunca fiz maldades do tipo colocar imagem de Santo Antonio de ponta cabeça pra casar. Mas amigas minhas atestam que funciona…

Queria tentar descrever, em oração, o que a gente sente, até o feltro da almofada ficar perfeitinho acomodado na ala dos eternos-amores, em departamento do peito.

– Querido Santo Antonio. Nunca peço nada. Mas desta vez, poxa, olha para esta pessoa. Ela combina comigo. Dá um jeito de aproximar a gente, por favor? – Querido Santo Antonio. Nunca peço nada. Mas desta vez, olha o que estou sentindo. É muito forte mesmo. Nunca senti nada assim antes. Dá um jeito de aproximar a gente? – Querido Santo Antonio. Nunca peço nada. Sei que o senhor não é o santo das causas impossíveis, mas tem como garantir ao menos dois dias, e juro que nunca mais peço nada. – Querido Santo Antonio. Como sabes, nunca peço nada. Mas viu o que aconteceu? Já me viu assim antes? Eu não estaria tão convencida de que é recíproco se não tivesse ouvido (e lido) uma declaração de amor linda. Achei que nossa despedida, tão dura, encerraria o assunto, mas não. Então, facilita um pouco as coisas? Gostaria muito mesmo de estar com esta pessoa mais vezes. Sim, no Pantanal. Sim, na Grande Muralha da China. Sim, nas ruas da Capital, cada um de um lado da rua, eu do meu lado correndo lágrimas de despedida pra sempre, até a próxima vez. Veja, não peço muito. Tem como dar um jeito? Posso depositar minha fé? Obrigada. – Querido Santo Antonio. Quase nunca peço nada. Me faz por favor esquecer esta pessoa? – Querido Santo Antonio. Tudo que quero é nunca mais esquecê-la. Porque é tanta lembrança boa, que gostaria de guardar no peito pra sempre. – Querido Santo Antonio, sabe o que eu queria mesmo? Um dia, não importa quanto demore, dançar com esta pessoa, então, morreria feliz. – Querido Santo Antonio, como sabes, nunca peço nada. Sei que andei pedindo ultimamente. Mas, como todos os pedidos foram ignorados, e os que não foram por favor desconsidere, será que poderia dar um jeito de viabilizar a viagem para o Mato Grosso? Olha, tanto faz ir sozinha ou ter a cia deste amigo, e que aconteça o que tiver que acontecer… – Querido Santo Antonio, percebe quanta esperança mora no meu peito? Poderia arrancá-la daqui, por favor? – Querido Santo Antonio, afinal das contas, quem ainda acredita nos teus milagres? – Querido Santo Antonio. Sei que tem colocado pessoas muito legais (acabaram de ligar aqui me convidando para fazer raffiting amanhã, desculpe por recusar, mas tem trabalho, o senhor sabe!), mas queria pedir que me fizesse prometer, jurar, de pés juntos, que não vou ficar ou namorar com nenhum destes moços maravilhosos que tem colocado no meu caminho, pura e simplesmente para matar o amor que sinto. Faça-me prometer, agora, que não cederei aos encantos de belos sorrisos, de homens altos, magros e fortes, por mais privilegiado que o colo seja. Faça-me jurar que eu aceitarei ao meu lado, tão somente, um homem que goste muito de ler, que aceite minha vocação (em desenvolvimento) de escrever, que represente para mim um desafio gigante, provoque palpitações no meu coração, e tudo isso que esta pessoa de quem eu gosto tanto ainda, provoca em mim. Rejeito qualquer amor menor que este! E nem me venha dizer para baixar meu padrão. Atenda o meu padrão! Agora que conhece o meu gosto, bem certinho, bom, nunca peço nada… Esqueça se algum dia pedi em contrário… – Querido Santo Antonio, estou um pouco confusa. Dá-me férias? Como assim não é teu departamento? Como assim o senhor é que precisa de férias depois de mim? … Querido Santo Antonio. Como estão as férias?