Grilo verde e amarelo, de Alegra Catarina.

Venho conversando com o mais novo sobre hipotético Projeto de Estudo das Densidades da Neblina. Seria preciso estabelecer uma régua de distância e a rotina de apontamentos diários do fenômeno observado. O mais velho dirige como se tivesse visão melhor que a minha (sob tais condições); a do meio prefere medir o calor do sol na pele; o menor me leva a sério.

Nebulosidade[1], opacidade[2], opcionalidade[3], probabilidade[4], Cisnes Negros[5], antifragilidade[6] – noto que mudei minhas escolhas de leituras. São menos crônicas e mais ensaios. Registro que ainda não sei como colocar tanto desconhecimento adquirido em prática. Meu amor, por sua vez, ouve o relógio, levanta, se veste, escova os dentes e então me beija, já se despedindo, põe água para esquentar, vai tratar os cachorros, volta, faz o café. Pra ele tudo é simples. Pra mim, tudo é complicado. Espero o cheiro de café chegar.

Este 09 de Setembro fará um ano que moramos todos juntos – em meio à névoa típica e assídua – no Bairro 25 de Julho. Preciso saber como me sinto, mas, ainda é 07 de Setembro e algum gesto de patriotismo é necessário. Depois a gente comemora!

Eu e os vizinhos da Rua Lindolfo Hastreiter – endereço do trabalho – enchemos o cesto no início da rua sem saída, pois o caminhão da Coleta Seletiva deveria passar hoje, segunda-feira, feriado, não veio. Considero a hipótese de recolher todo o material reciclável com a caminhonete e levar até a frente do portão da cooperativa de reciclagem, deixar lá para ser processado na terça. Meu amor hesita um segundo, concorda, “só porque te amo muito” e estamos com roupa de três dias de trabalho: faxina, pintura, arrumações.

Chegamos na cooperativa, para nossa surpresa, os portões estão abertos. Pergunto à Dona Mocinha onde posso descarregar, ela indica o lado esquerdo, mais aos fundos do galpão. Outra moça nos aguarda, começa a tirar o material da caçamba, depositar no início da esteira ligada. Pego algumas sacolas, copio o trabalho. Olho para a extensão do equipamento. Quinze pessoas dividem a função de triar e o material é escasso. Foi bom ter vindo.

A rua que dá acesso ao PEV (Ponto de Entrega Voluntária) – destino das lâmpadas queimadas – está com meios fios instalados, pronta para ser asfaltada. Comento, a caminho, sobre a vocação dos engenheiros de obras (viárias): é trabalho para muitas vidas. Menos importante, conto obras grandiosas que não fiz. Luto, brava, para desviar de inventar coerências, narrativas de simplificação. Mas se quero servir à arte (vi isso num seriado): tenho que aprender a expressar meus sentimentos.

Pequena, me impactou muito assistir à novela “A Rainha da Sucata” e desde então acredito ser possível a qualquer um: começar do nada, construir um império, quem sabe virar Prefeito ou Presidente da República. O caminho é nebuloso, obter apoio é altamente improvável, ninguém garante que não possa acontecer com você!

É grave que crianças não sejam incentivadas, de cedo, a criar seus próprios métodos de identificar e rastrear as milhares de variáveis que impactam em um único evento, positivo ou negativo. A aproveitar melhor o tempo, e exemplos, a seu favor.

Essas linhas foram escritas sem rigor científico. São meras observações. Se você não entendeu nada – e era de se esperar – entendeu certo.


[1] Estado ou condição de nebuloso;

[2] Qualidade, estado, propriedade do que é opaco; ausência de transparência. Sombra cerrada, densa; local sombrio, brumoso.

[3] Pressupõe possibilidade ou escolha, diferentemente de um contrato tradicional, que, quando firmado, precisa necessariamente ser cumprido.

[4] Chance de obter determinado resultado em um experimento.

[5] A teoria do Cisne Negro se trata de um evento adverso e que vai contra aquilo que é considerado seguro, ou normal. Referência ao livro “O Cisne Negro” de Nassim Nicholas Taleb.

[6] Descreve a capacidade de crescer e se aprimorar em resposta ao estresse, volatilidade e desordem, em oposição à fragilidade, que sugere que algo se deterioraria ou quebraria sob as mesmas condições.